- A história do movimento puritano e suas ênfases principais
À medida que percebemos que o mundo ocidental está se esfacelando diante dos nossos olhos, constatamos que vivemos uma crise moral terrível. Acreditamos que a solução seria um avivamento produzido pelo Espírito Santo. Em última análise, dependemos unicamente de Deus vir ao nosso encontro. Sabemos que isso aconteceu no século XVII, na época dos Puritanos. Portanto, embora estejamos aqui tratando de coisas que aconteceram entre três e quatro séculos atrás, cremos que a situação em que os Puritanos se encontravam se assemelha em muito à dos nossos dias. Acreditamos que o Senhor Jesus é o mesmo ontem, hoje e o será eternamente; que a graça de Deus é suficiente para cada geração; e que obviamente Deus não perdeu nada do Seu poder, ou do Seu amor e da Sua misericórdia. Temos toda a razão do mundo para invocá-Lo e pedir que faça o mesmo que já fez no passado.
Enquanto estudamos os Puritanos e pensamos no que aconteceu na Inglaterra e na Escócia, temos a plena confiança de que isso vai nos encorajar e nos conscientizar de que Deus pode trabalhar da mesma forma maravilhosa ainda nos dias de hoje; no Brasil, na Escócia ou na Inglaterra, em qualquer lugar onde o nome de Jesus for invocado.
O que nos dá a chave para compreender o Movimento Puritano é a concepção de Avivamento. Portanto, citamos um profundo conhecedor de História da Igreja que ensinou na Universidade de Princeton, Professor Latoretti. No final da segunda guerra mundial, ele escreveu um pequeno livro, mas de grande valor, sobre a História da Igreja, cujo nome é “A Luz Inextinguível”. Em menos de cem páginas ele conseguiu resumir de forma clara o movimento e a obra de Deus na história. Vejam o que ele disse:
A influência de Jesus tem crescido com o passar dos anos e nunca foi tão poderosa como nos últimos 125 anos. A influência de Cristo pode se comparar ao avanço das marés. A maré se projeta e cresce através da vinda sucessiva de ondas. À medida que uma nova onda chega, ela eleva o nível da água um pouco mais acima. Semelhantemente, à medida que aquela onda recua, há uma recessão. A próxima onda coloca o nível da água em um nível acima da onda anterior. Portanto, desta forma, cada um dos períodos de recuo, quando as ondas retornam, é menos notado do que na vez anterior.
Em outras palavras, o que o Prof. Latoretti está dizendo é o seguinte: O Cristianismo se move e progride em termos de avivamento, como estas ondas, seguidas de períodos de recessão, de retraimento. Avivamento, recessão, avivamento. Mas cada novo avivamento nos leva além da posição anterior, nos dá mais luz do que o anterior; ao mesmo tempo em que esses períodos de recessão e esfriamento que se seguem, nunca são tão profundos como nos períodos de retração anteriores.
Tem havido vários avivamentos e períodos de retração na história da Igreja, mas o nosso assunto começa aqui com a grande Reforma Protestante no século XVI. Poderíamos dizer muita coisa a respeito da Reforma da perspectiva política, social e militar. Todas elas são importantes, mas ninguém poderá compreender o que foi realmente a Reforma até que se conscientize de que ela nada mais foi do que um “derramar do Espírito Santo” sobre o povo da Europa. A Igreja Católica medieval, no último período da Idade Média, estava profundamente corrompida. O Evangelho havia sido obscurecido pela filosofia tomista e também por uma série de acréscimos humanos na vida da Igreja. Havia muita depressão e confusão, além de imoralidade em toda a Europa. O povo havia se tornado céptico, incrédulo; e esta é uma das razões em que a Renascença encontrou apoio.
Foi um período muito difícil, exatamente como o nosso hoje. Nessa época, um simples monge desconhecido redescobriu a verdade de que somos justificados pela graça e que não somos salvos por nossas obras mescladas com os sacramentos da Igreja, mas que o sangue de Jesus, o Filho de Deus, nos purifica de todo pecado; e que o crente no Senhor Jesus pode chegar a conhecê-Lo sem a mediação da Igreja. Lutero redescobriu que o cristianismo é na realidade uma experiência direta da alma com o Senhor Jesus agora, e que na ressurreição futura, o corpo terá esta experiência. Nós temos a impressão de que com a Reforma a alma da Europa foi libertada. Houve uma explosão de louvor, de hinos sendo escritos e grande alegria, como uma experiência direta da alma com o Senhor Jesus. Houve também uma purificação da vida moral e a família foi fortalecida; houve avanços na medicina e em outras áreas do conhecimento científico.
O mundo nunca mais foi o mesmo após este grande avivamento que bem conhecemos como a Reforma. Mas, na realidade, não foi um movimento perfeito; e especialmente na Inglaterra havia uma preocupação por parte dos crentes de que a Reforma não houvesse se estendido o suficiente. Os Reis da Inglaterra tinham controle sobre a Igreja e podiam tolerar que houvesse uma reforma dentro dela, mas não queriam permitir a reforma de coisas vindas do Catolicismo, e que já estavam estabelecidas. O receio deles era que se a Igreja se reformasse totalmente, na Inglaterra e na Escócia, eles perderiam o poder.
É neste cenário que os Puritanos aparecem. Depois da Reforma, na Inglaterra e na Escócia seguiu-se um período de recessão e esfriamento. Para usar uma figura do Prof. Latoretti, durante a Reforma veio aquela grande onda espiritual que depois foi seguida por uma baixa no fervor do povo. Havia um grande grupo na Inglaterra e na Escócia que tinha um desejo profundo de ver uma reforma completa na vida da Igreja. Essa vontade era controlada por aquilo que conhecemos como o princípio regulador do movimento Puritano. A idéia é esta: Tudo no culto deve ser regulado e controlado pela Palavra de Deus escrita. Para esse grupo, aqueles acréscimos humanos ao culto, que não podiam ser demonstrados nem apoiados pela Escritura, deviam ser tirados. Esse grupo não queria que se permitisse o acréscimo cada vez maior de tradições humanas no culto, pois isso quebraria o segundo mandamento, obscureceria a clareza do Evangelho e impediria que o poder de Deus viesse sobre a Igreja. Por causa desse desejo, esses crentes fervorosos na Igreja, na Inglaterra e na Escócia, vieram a ser chamados e conhecidos como Os Puritanos. A palavra vem do inglês e significa purificar.
Em primeiro lugar, eles queriam purificar a Igreja de Deus, especialmente o culto, através da Palavra de Deus escrita. Mas não pararam aí, estavam interessados em purificar também, em segundo lugar, o governo da Igreja e depois a vida da família, o comércio, e os negócios. Daí passavam para o governo civil; queriam purificar a forma do governo dirigir a nação. Eles queriam reformar as escolas e as universidades à luz da Palavra de Deus. Por isso começaram a orar e a pregar para que toda a terra, em todos os aspectos do país, fosse reformada pela Palavra. Geralmente é aceito pelos historiadores que o Movimento Puritano começou no fim de 1550 e se estendeu até o século seguinte, no ano de 1600. Mas há quem diga (Prof. Sidney da Universidade de Yale) que o período puritano se estendeu nos E.E.U.U. além dessa data, até à eleição de John Kennedy, em 1960.
A bênção maior de Deus em tudo isso foi a seguinte: À medida que os Puritanos tinham esse desejo profundo de Reformar, em todos os aspectos, a Inglaterra e a Escócia, havia uma quantidade enorme de jejuns e orações para que o Espírito de Deus viesse sobre aquela terra. Os Puritanos, juntamente com Calvino, mantinham juntos estes dois conceitos: A palavra de Deus e o Espírito Santo. Então, à medida que eles pregavam a Palavra de Deus, também oravam para que o Espírito viesse satisfazer a fome dos que a ouviam. Eles sabiam que a Palavra sem o Espírito seria morta, sem vida; e que o Espírito sem a Palavra poderia tornar-se em confusão e desordem; mas sabiam também que a Palavra de Deus juntamente com o Espírito traz a vitória, a vida e a reforma. Assim, ao mesmo tempo que oravam por despertamento, também estavam fazendo o que podiam através da pregação, da literatura e da mudança do governo. À medida que eles estavam engajados nessas atividades, percebia-se que estava chegando sobre toda a terra uma fome da Palavra de Deus.
O governo Inglês começou a perseguir os Puritanos porque temia que eles acabariam por dar à Igreja um poder político muito grande. Mesmo que os Puritanos estivessem sendo perseguidos, a sua influência entretanto estava se espalhando pelo país. Não há dúvida alguma de que era o Espírito Santo que estava predispondo os corações e dando a todos a fome de ouvir a pregação Puritana. Milhares e milhares de pessoas, tanto da Escócia como da Inglaterra, se congregavam para ouvir a pregação dos Puritanos. Depois de trinta anos de pregação, desde o início do movimento, a mensagem dos Puritanos começou a produzir mudanças. Os primeiros pregadores Puritanos, durante os primeiros trinta anos do movimento, não viram resultado da sua pregação. Eles pregavam o máximo que podiam, oravam muito, trabalhavam e escreviam livros maravilhosos e conseguiram até mesmo colocar excelentes professores nas universidades de Cambridge e Oxford. Mas durante vinte ou trinta anos receberam muito pouco apoio ou resposta. De repente, no final do século XVI e início do século XVII, ocorreu uma tremenda resposta do povo à pregação e propostas dos Puritanos.
Tudo isso nos ensina que não devemos perder a paciência e ficar desencorajados se não temos resultados à primeira vista. Deus pode estar nos usando para preparar uma tremenda bênção que a geração seguinte irá desfrutar. E mesmo que não vivamos o suficiente para ver essa bênção, nos alegraremos juntos no grande dia da colheita, no último dia. O que importa é que o Senhor Jesus vai receber a glória e será coroado com mil coroas naquele grande dia. O calendário de Deus não funciona segundo os nossos desejos.
Não queremos entrar em detalhes no conflito político entre os Puritanos e o governo. Apenas mencionaremos que o Rei Carlos I odiava os Puritanos. Ele era secretamente um católico romano, mesmo sendo considerado o cabeça da Igreja da Inglaterra. Ele elegeu então o Arcebispo de Cantuária, Arcebispo Laud, que era uma pessoa tremendamente preconceituosa contra os Puritanos. Com a autoridade dada pelo estado e pelo Rei, Laud começou a perseguir os Puritanos onde quer que pudesse. Foi por esta época que os pais peregrinos cruzaram o oceano e vieram da Europa para a América do Norte. Dessa forma os primeiros peregrinos colonizadores da América do Norte foram aqueles Puritanos perseguidos na Inglaterra.
Durante muitos anos o Rei Carlos I governou de forma irregular, sem nenhuma reunião do Parlamento. Subitamente, ele se viu diante da possibilidade de uma guerra com a Escócia. Isso fez com que convocasse o Parlamento para conseguir os recursos necessários para sair à guerra. Ele convocou o que se chamou de Breve Parlamento. Com surpresa e horror constatou que aquele Parlamento, na grande maioria, era composto de homens favoráveis aos Puritanos. Imediatamente dissolveu o Parlamento, antes que tomassem qualquer decisão e começassem a reformar o país. Mas o problema continuava: não havia dinheiro no tesouro real. Enquanto isso, em Edimburgo, o Rei começara uma “guerra litúrgica” contra a Escócia, que já tinha purificado o culto de todos os acréscimos humanos. Os escoceses estavam furiosos com a possibilidade de que qualquer tipo de catolicismo fosse introduzido outra vez no culto, pois a Igreja da Escócia era muito mais reformada do que a Igreja da Inglaterra. Então, o Rei resolveu mandar as suas tropas e obrigar a Igreja da Escócia a seguir o Livro Comum de Oração que era usado na Igreja da Inglaterra. Naquele tempo, o Rei era monarca da Inglaterra e da Escócia. Os escoceses tinham chegado à conclusão de que o livro de orações tinha muita coisa remanescente do catolicismo em termos humanos, por isso o haviam abandonado. O Rei então enviou uma alta autoridade eclesiástica para a Catedral principal da Escócia e durante o culto ele começou a ler o livro de orações. Mas o povo da Escócia estava muito bem preparado para agir. Naqueles dias não havia bancos confortáveis nas catedrais como temos hoje. Todos traziam banquinhos que eram usados na ordenha das vacas. Uma fonte diz que, no decorrer do culto, uma moça simplesmente pegou o banquinho de três pernas e o jogou na cara do bispo. De repente a catedral se encheu de banquinhos de três pernas voando de um lado para outro, e aqueles que eram da Igreja da Inglaterra começaram a correr para salvar a pele.
A Escócia se organizou em um grande exército para atacar a Inglaterra. Finalmente, o Rei Carlos I conscientizou-se de que devia convocar o Parlamento, mesmo que fosse Puritano. Este se tornou o que se chama o Grande Parlamento, que se reuniu por 12 anos sem qualquer interrupção, (1640-1652), até que foi finalmente dissolvido por Cromwell. Embora houvesse muitos partidos dentro deste Parlamento, a grande maioria era a favor dos Puritanos. Eles eram também contra o catolicismo e contra o poder absoluto do monarca; não eram contra a monarquia em si, mas contra a monarquia tirânica. Este Parlamento estava decidido a reformar a vida da Igreja através de leis e reformar a própria lei. Foi este Parlamento que convocou a Grande Assembléia de Westminster, que começou a reunir-se há 350 anos, em 16 de setembro de 1643. (Em1993, comemorou-se a data na Inglaterra com um grande encontro na Capela de Westminster). A Assembléia de Westminster foi uma grande assembléia, composta de pastores e teólogos de todas as partes das Ilhas Britânicas, e que escreveram nossos símbolos, debaixo da autoridade da Igreja, ou seja: a Confissão de Fé de Westminster, o Catecismo Maior e o Breve Catecismo, além de um livro de regulamento para o culto e uma edição de livros de salmos metrificados para serem cantados no culto. A lei determinava que esta seria a Confissão de Fé em toda a Inglaterra. Os presbiterianos sabem que a Confissão de Fé de Westminster é uma expressão da crença dos Puritanos; e que foi inspirada pela teologia de João Calvino, de Agostinho, do apóstolo Paulo, e, na verdade, inspirada pelas Escrituras na sua inteireza. Ela dá grande ênfase na soberania de Deus e no controle absoluto que Ele tem de todas as coisas para a Sua glória, e na necessidade de uma vida santa e de obediência a Ele.
Não muito tempo depois, o Parlamento teve de organizar um exército para marchar contra o próprio Rei. O Rei, na verdade, queria dissolver o Parlamento, mas não conseguia fazê-lo. Ele havia feito um acordo secreto com os católicos franceses para enviar um exército católico francês à Irlanda e assim derrotar as forças do Parlamento. Porém os Puritanos foram capazes de organizar um exército mais poderoso do que o do Rei. Eles foram abençoados porque estava comandando o seu exército o General Oliver Cromwell. Não precisamos entrar em detalhes, mas o exército do Parlamento foi totalmente vitorioso sobre o exército do Rei. Finalmente, depois de três dias de julgamento, eles vieram a cortar a cabeça do Rei. Os Puritanos estavam divididos sobre esta questão. Os Escoceses e Presbiterianos eram contra matar o Rei, mas os Independentes, e os Congregacionais da Inglaterra, eram a favor da decapitação. Assim, com a morte do Rei, a Inglaterra foi dirigida, durante muitos anos, pelo Parlamento. Posteriormente Oliver Cromwell assumiu o poder como Protetor (foi uma época áurea para os Puritanos e para o desenvolvimento da Inglaterra). Finalmente, com sua morte em 1660, a monarquia voltou ao poder, com o retorno de Carlos II da França, o filho de Carlos I.
Aqui, politicamente, o poder puritano acabou na Inglaterra; mas, religiosa e socialmente, sua influência continuou por muitos anos. Na verdade a Inglaterra nunca mais foi a mesma após o Puritanismo.
Devemos mencionar de forma breve três ênfases teológicas dos Puritanos. Acreditamos que estes três princípios ou ênfases teológicas fizeram os Puritanos vitoriosos e triunfantes em seu propósito de mudar o mundo. As três ênfases são estas:
- Predestinação
- Esperança
- Vocação (chamado)
Existem muitos outros fatores, mas acredito que o coração do movimento Puritano pode ser resumido com estas três coisas.
PREDESTINAÇÃO
Quanto a isso, citaremos um grande historiador contemporâneo de Oxford, Prof. Christopher Hill. Ele aparentemente não é crente, e muitos o tem acusado de ser marxista, mas o que sabemos é que ele tem grande apreciação pelas reformas introduzidas pelos Puritanos. Ele enfatiza a força na crença da predestinação dentro da causa Puritana. Citaremos o seu livro sobre o puritano Oliver Cromwell, chamado o Inglês de Deus (Já traduzido para o português com o título – O Eleito de Deus). Ele disse:
“Os homens tem geralmente comentado sobre o aparente paradoxo de um sistema teológico que crê na predestinação e que, ao mesmo tempo, produz nas pessoas uma ênfase tão grande em esforço e energia moral”.
Em outras palavras, muitos dizem que se você crê na Predestinação, na soberania de Deus, você não vai fazer mais nada. A História prova exatamente o contrário. Na realidade aquelas pessoas que crêem firmemente na soberania de Deus são as mais ativas e corajosas. Voltemos à citação do Prof. Hill: –
Acredito que o motivo pelo qual os Puritanos foram tão ativos é por causa da consciência da eleição de Deus. Os seus corações haviam sido transformados na direção do Deus vivo. Um homem sabia que estava salvo porque sentia, em algum momento da sua vida, uma satisfação interior, um lampejo que lhe dizia que ele estava em comunhão direta com Deus. Não estamos aqui lidando com uma êxtase místico de um monge, mas com a consciência de pessoas comuns como donas de casa, artesãos ou comerciantes.
O que dava a estas pessoas tanta força? Era a sensação de que tinham o Espírito de Deus. Era então, a sensação de terem sido fortalecidas por este Espírito. Era este conjunto de coisas que fazia com que o homem do povo sentisse que qualquer que fosse sua atividade, ela possuía valor diante de Deus. Esta convicção de ter sido eleito e de ter comunhão com Deus através de Cristo deu-lhes autoconfiança numa época em que havia tanta incerteza econômica e adversidade política.
Aqueles que criam como os Puritanos, tinham uma “fé interior que os fazia sentirem-se livres, quaisquer que fossem suas dificuldades externas”. O Prof. Hill cita o Prof. Haller dizendo o seguinte: “As pessoas que têm certeza de que herdarão o céu, possuem meios de, no presente, assumir a posse da terra”. Completa o Prof. Hill dizendo que “foi essa coragem e confiança que capacitavam os Puritanos a lutar por meio de armas espirituais, econômicas ou militares, para criar um mundo novo, digno daquele Deus que os havia abençoado de forma tão marcante”.
O Dr. Perry Miller, da Universidade de Harvard, que é o grande historiador dos Puritanos nos EUA, certa vez disse:
É impossível você imaginar um Puritano sem esperança; eles criam na soberania de Deus, e isso os fazia agir em face a qualquer dificuldade. Eles sabiam perfeitamente que, se Deus é por nós, nada ou ninguém pode ser contra nós.
Até que tenhamos esta confiança é duvidoso que a Igreja de Deus seja o que deve ser na época presente. Nós sempre podemos encontrar uma desculpa para nos comprometer com o mal, se quisermos. Mas aqueles que têm este senso de comunhão com Deus e confiança no Seu propósito soberano, não procuram comprometer a sua fé. Tão grande é a convicção de que o Senhor Jesus Cristo está próximo, que sabem ser muito mais importante agradar o Senhor Jesus do que agradar os desejos humanistas. Assim, vemos como a doutrina da Predestinação era um dos sustentáculos do sistema Puritano e da sua causa.
ESPERANÇA
Em segundo lugar, o movimento puritano era impulsionado por uma teologia baseada na esperança bíblica. Ian Murray, que é editor da Banner of Truth, escreveu há cerca de 20 anos um livro extraordinário chamado “The Puritan Hope” (“A Esperança Puritana”, em português), mostrando a interpretação puritana otimista das profecias bíblicas, e como isso levou os Puritanos a esperar que Deus estivesse prestes a concluir a história humana com um triunfo maciço para o Evangelho em termos globais, com a conversão dos judeus e da grande maioria dos gentios através de grandes derramamentos do Espírito Santo, aos quais chamavam de a “Chuva tardia” que viria nos últimos tempos.
Esse tipo de visão que os Puritanos tinham do futuro libertou, na ocasião, presente, os seus corações para colaborar de forma alegre e satisfeita com o propósito de Deus, em termos de se auto-sacrificar para obedecer totalmente a Deus. Eles estavam convencidos de que, uma vez que o Senhor Jesus havia ressuscitado dentre os mortos, não podiam ser derrotados de forma alguma se Deus estivesse ao lado deles.
Aqui está uma declaração típica do grande teólogo puritano John Owen. Ele foi, durante o protetorado de Cromwell, vice-chanceler da Universidade de Oxford, e perdeu esta posição quando voltou a monarquia e o Rei Carlos II. Entretanto, ele continuou a servir a Deus de forma corajosa e brava, sem nunca ficar desiludido ou perder a esperança, mesmo estando em minoria, sem qualquer poder político naquela época. Isso é o que ele escreveu em 1680:
“mesmo que nós caiamos, a nossa causa será infalivelmente vitoriosa porque Cristo está assentado à mão direita de Deus; o Evangelho triunfará e isso me conforta de forma extraordinária”.
James Hanik do partido dos “covenants” (pactuantes), que foi martirizado no dia 17 de fevereiro de 1688, em Edimburgo, disse no dia do seu martírio:
“tem havido dias gloriosos e grandiosos do Evangelho nesta terra, mas eles serão nada em comparação àquilo que haverá de ocorrer”.
Esse tipo de pessoa que tem tanta esperança no futuro, não pode ser derrotada. Enquanto o Diabo tenta nos desencorajar quanto ao futuro, Deus procura nos fortalecer e encorajar com respeito ao que Ele pode fazer.
VOCAÇÃO
Queremos mencionar, finalmente, outra verdade que fez com que os Puritanos fossem tão fortes e eficazes nos seus dias. Era a ênfase que davam na importância da vocação de cada pessoa. Enfatizavam a necessidade de cada pessoa glorificar a Deus através da sua vocação secular. Sem dúvida, Martinho Lutero já havia ensinado o sacerdócio universal dos santos, e os Puritanos criam nisso. Mas eles desenvolveram a doutrina do chamado de Deus a cada pessoa muito além do que alguém fizera antes. Mesmo estudiosos marxistas do século XX, como o Prof. Arcangius de Leningrado, dá crédito aos Puritanos por terem elevado a moral da classe trabalhadora da Inglaterra naquele período. O próprio Prof. Hill está sempre citando estes estudiosos marxistas que têm essa visão positiva com relação aos Puritanos neste aspecto.
Obviamente, o levantamento do moral da classe trabalhadora da Inglaterra com o movimento Puritano se deveu à ênfase Puritana sobre a santidade da vocação de cada pessoa. Ao invés de simplesmente distribuir recursos com as pessoas pobres, os Puritanos organizaram sociedades e sistemas, que pudessem ajudar estas pessoas a aprender uma vocação. Eles diziam às pessoas pobres que elas haviam sido criadas à imagem de Deus tanto quanto o Rei, e que o sangue de Jesus tinha sido derramado por todo tipo de pessoas (não por todos). Que eles haviam sido chamados para servir a Deus em suas vidas de acordo com o propósito de Deus. Diziam às pessoas que, quando alguém está varrendo um quarto de forma responsável, está ajudando a avançar o Reino de Deus tanto quanto um grande pregador. Com este tipo de pregação, os pobres começaram a sentir um novo senso de dignidade e começaram a desenvolver os talentos que Deus lhes havia concedido em favor da Inglaterra.
O roubo, os crimes, e a violência caíram tremendamente de nível neste período. Os Puritanos organizaram vários tipos de sociedades voluntárias para dar treinamento e qualificação aos pobres, além de estudiosos para ajudar aos jovens a fundar hospitais de caridade. Tudo isso tinha apenas um propósito: todas as pessoas, sejam ricas ou pobres, podem viver para a glória de Deus.
Quero concluir esta palestra sobre o Puritanismo na Inglaterra citando a 1ª pergunta do Catecismo Maior de Westminster: “Qual o fim principal do homem? Resposta: glorificar a Deus e gozá-lo para sempre”.
- O legado puritano
Gostaríamos de falar sobre a herança que os Puritanos nos deixaram, o seu legado para os dias de hoje. O poder político dos Puritanos durou apenas 20 anos (1640 – 1660), mas a tremenda influência deles permanece ainda hoje no mundo todo. Na primeira palestra, citamos o “Princípio Regulador” puritano, ou seja, que no culto nada deve ser permitido que não tenha o apoio da Palavra de Deus escrita. O que faremos agora é expor como os Puritanos tomaram este “Princípio Regulador” e o aplicaram fora das quatro paredes da Igreja em todas as áreas da vida. O que eles entenderam é que cada área da vida, para que seja abençoada, tem que ser orientada, controlada, e regulada pela Palavra de Deus. Gostaríamos de outra vez citar o Prof. Christopher Hill:
O conjunto de idéias que chegou a ser chamada de ‘O Puritanismo’ era uma filosofia de vida, uma atitude com relação ao universo, que de forma nenhuma deixava de lado os interesses da vida secular. O Puritanismo no século XVII não era, no sentido mais estrito, limitado à religião e a moral. A ciência, a história e outras disciplinas, não foram deixadas de lado por eles.
Os Puritanos se tornaram distintos de muitos outros evangélicos exatamente por esta visão. Muitos evangélicos fazem uma diferença radical entre aquilo que é sagrado, espiritual, e o que não é espiritual, o que é secular. Muitos crentes não conseguem aplicar os princípios que ouviram na Igreja aos domingos, à vida no lar e no trabalho. Isso era exatamente o que acontecia na Igreja Católica na Idade Média. Havia uma dicotomia profunda entre aquilo que era eclesiástico (o que era sacerdotal) e o que era comum, o que era dos leigos. Esta dicotomia tem retornado de forma diferente à nossa sociedade. É por isso que nós precisamos escutar o que os Puritanos têm a nos dizer, porque eles rejeitaram de forma absoluta qualquer distinção entre estes dois aspectos, ou seja, entre o que é sagrado e o que é secular. Vejamos o que disse William Tyndale, um dos tradutores da Bíblia para o inglês, e antecessor dos Puritanos que chegou a ser martirizado por causa do seu trabalho. Ele disse:
“Existe uma diferença entre lavar pratos e pregar a Palavra de Deus, mas no que se refere a agradar a Deus, não existe qualquer diferença entre estas duas coisas”.
O grande teólogo puritano William Perkins disse o seguinte:
“A obra do pastor em pastorear as suas ovelhas é um trabalho tão bom diante de Deus quanto a atitude ou o trabalho de um juiz em passar uma sentença, ou um magistrado em fazer um julgamento ou de um pregador em sua pregação”.
Dr. Leland Ryken, que escreveu “Santos no Mundo“, disse o seguinte com referência a esta rejeição dos Puritanos da dicotomia entre o que é sagrado e o que é secular:
Os Puritanos criam que Deus havia criado o mundo físico e humano, e que tudo isso era bom em princípio. Eles acreditavam que o mundo físico apontava para Deus, e neste ponto eles eram os ‘sacramentalistas’ dos seus dias, muito mais do que aqueles que multiplicavam as cerimônias dentro das quatro paredes da Igreja.
Um outro puritano disse:
“Um crente deve considerar tanto o seu escritório quanto a sua Igreja como sendo santo”.
Isso significa que a Palavra de Deus fala de forma normativa, não somente para a Igreja, como também para a minha vida pessoal, em todas as suas esferas. Portanto, o propósito da criação é ser normatizada, controlada pelo propósito do Criador. William Perkins disse que
“A Bíblia abrange muitas ciências sagradas, incluindo a ética, a economia, a política e as ciências acadêmicas”.
Vamos tentar fazer um sumário: O puritano cria que estava na presença de Deus e fazendo a obra de Deus em qualquer lugar que ele fosse, e não somente na Igreja. Ele sentia que era o seu chamado transformar cada área da vida em algo santo para Deus. Vamos ver algumas áreas que os Puritanos desejavam purificar no mundo. É nesse aspecto que eles deixaram um legado extraordinário para os dias de hoje.
Em primeiro lugar, eles queriam a Reforma total da Igreja segundo as Escrituras. Eles acreditavam que a melhor forma de se obter isso era através da pregação expositiva de todo conselho de Deus. Acreditavam que, se a pregação viesse através da exposição dos livros da Bíblia, uma reforma sobrenatural aconteceria como resultado. Para tal, era necessário que todas as partes da Bíblia fossem entendidas, para se dar um caráter equilibrado à reforma. Acreditavam na necessidade de pregar de forma direta ao coração. Na realidade, a pregação puritana é mais conhecida como pregação direta. Desejavam falar às pessoas simples, de forma direta e não rebuscada, e que fosse compreendida. Esse conceito era muito diferente do que era praticado na Igreja Anglicana daquela época. A pregação Anglicana daquele tempo era muito florida, rebuscada, com citações em grego, hebraico e latim. Muitos dos pregadores na Igreja Anglicana pregavam apenas com o propósito de impressionar os professores das universidades que estavam presentes. Os Puritanos entendiam que este tipo de pregação era uma glorificação do pregador ou demonstração de erudição, muito mais do que a declaração do conselho de Deus. O propósito da pregação não era o de glorificar o pregador e toda a sua erudição. O propósito do pregador era o de se esconder atrás do texto o máximo que pudesse para que o Senhor fosse exaltado em toda a Sua glória e beleza. Assim, os Puritanos pregavam de forma simples e direta em muitos assuntos, e colocavam grande ênfase na aplicação da Palavra.
Geralmente passavam meia hora expondo o que havia no texto, e mais meia hora na aplicação desse texto. Eles diziam o que o texto falava aos diversos tipos de pessoas presentes na congregação. Diziam o que a Palavra tinha a ensinar às pessoas que já eram salvas, aos perdidos e àqueles que estavam em busca da salvação; mostravam o que o texto falava aos pais, às crianças e até ao Rei e ao governo. Por isso, alguns deles foram lançados na prisão e tiveram suas orelhas cortadas. Apesar disso, continuavam pregando da mesma forma, e a Palavra era aplicada poderosamente. Eventualmente, muitas Igrejas fecharam suas portas para esta pregação puritana. Foi quando um número grande de homens de negócios bem sucedidos, em Londres, começaram a fazer depósitos bancários para investir e a usar os juros daquela aplicação para sustentar centenas de pregadores Puritanos que se espalhavam pela Inglaterra pregando a Palavra. Estes homens estavam convictos de que a Inglaterra e Escócia haveria de florescer pela pregação da Palavra, e literalmente pagavam para isso. Quando um pregador Puritano não conseguia pregar nas Igrejas, ele ia para a feira, e lá pregava a dezenas e centenas de pessoas que vinham para as compras. Geralmente os simpatizantes dos Puritanos que eram proprietários de negócios, e que tinham instalações amplas, cediam-nas para que os Puritanos pregassem. Dessa forma, milhares de pessoas eram atingidas pela Palavra. Eles literalmente tomaram o mapa da Inglaterra e procuraram garantir que cada parte do país tivesse pelo menos um pregador Puritano, para que a obra reformadora de Deus fosse acessível a cada parte da nação. Dessa forma, a influência do puritanismo cresceu ao ponto de tomar o Parlamento. Esta é a primeira coisa que podemos aprender com eles: buscar a purificação da Igreja e da sociedade pela pregação da Palavra.
Em segundo lugar, vamos falar sobre a vida de piedade dos Puritanos. Já falamos sobre a reforma da Igreja, e agora falaremos sobre a reforma do coração. Os Puritanos estavam em conflito para manter juntas duas coisas: de um lado, um coração que ardia em amor a Deus e ao próximo; e de outro, um intelecto preparado, pois entendiam que se a mente fosse bem educada e preparada e se o coração fosse cheio de fervor e amor a Deus, as pessoas seriam transformadas à imagem de Cristo e seriam capazes de mudar a comunidade em que viviam. A expressão que os Puritanos sempre usavam para isso era “autocontrole”. Em termos modernos, usando uma expressão teológica contemporânea, diríamos “cheio do Espírito Santo”. Uma das maneiras pelas quais os Puritanos buscavam o “autocontrole,” ou o andar “cheio do Espírito Santo”, mantendo o coração e a mente aquecidos, era através da meditação contínua na Palavra de Deus. A espiritualidade puritana nunca foi dissociada da Palavra de Deus escrita, e isso é muito importante e deve ser lembrado hoje.
A única espiritualidade que realmente vem de Deus é a que é consoante ao ensino da Palavra. Um dito puritano afirmava:
“Pregações são como a comida na mesa; você deve comer, mastigar bem; um sermão bem digerido e sobre o qual você meditou bem é melhor do que vinte sermões sobre os quais você não meditou”.
Os Puritanos faziam comparação com uma vaca ruminando. Entendemos que uma das razões da nossa superficialidade, como evangélicos, é que não queremos tirar tempo para meditar na Palavra de Deus. Os Puritanos eram pessoas tão ocupadas quanto nós hoje, mas tinham essa prioridade diária de meditar na Palavra, na verdade. Eles voltavam para casa depois do culto para discutir e conversar a respeito do sermão com seus filhos.
Em terceiro lugar, isso nos leva a um outro aspecto importante do legado Puritano. Não somente eles estavam controlando a vida da Igreja e a vida pessoal através da Escritura, mas também a vida doméstica. Há cerca de um século, o famoso historiador Inglês J. Richard Greenhan disse:
O lar, como nós hoje o conhecemos, foi criado pelos Puritanos. A esposa e os filhos emergiram de uma simples dependência do pai, à medida em que os pais e maridos percebiam nas suas esposas e filhos santos exatamente como eles, almas que haviam sido santificadas pelo toque do Espírito Santo e que haviam sido chamadas com a mesma vocação divina com a qual eles haviam sido chamados. Essa sensação de comunhão dentro da família trouxe uma nova ternura e um refinamento aos sentimentos, às afeições do lar .
Em quarto lugar, ao invés da assistência diária à missa, como na Igreja Católica, os Puritanos instituíram o culto doméstico diário. Isso foi um passo sociológico muito importante. O Prof. Hill o considera como a “espiritualização da família”. À medida que a família e a casa eram vistas por esta perspectiva, se tornavam então, como um outro centro de governo. E à medida que o lar era visto como tendo esta independência, funcionava como oposição, com o objetivo de equilibrar aquele governo autoritário que havia. O lar Puritano, então, era um lugar onde Deus era encontrado em amor, onde os membros da família eram respeitados como santos, e onde a Palavra de Deus era continuamente ouvida e difundida.
É uma grande falsidade que se levanta contra os Puritanos dizer que eram opostos a qualquer tipo de sexualidade. Se você se dedicar a ler sobre os Puritanos, vai ver que não é assim. Eles se baseavam no Velho Testamento e nas epístolas para se deleitarem no dom da sexualidade dado por Deus. É verdade que os vitorianos do século XIX, na Inglaterra, tinham uma certa antipatia por este assunto. Mas, na realidade, esse pessoal da era vitoriana pode ser considerado mais como humanistas do que propriamente como Puritanos.
Este princípio regulador é relacionado com a área da educação. Os Puritanos frequentemente mencionavam um dito rabínico:
“Se um pai não ensina ao seu filho a Lei de Deus, e se não o treina numa profissão decente, está criando-o para ser um ladrão”.
Na Nova Inglaterra, nos EUA, no início da década de 1630 e 1640, algumas leis foram estabelecidas determinando que todo pai deveria assegurar a educação de seus filhos. A lei era esta: “As pessoas devem ser instruídas em alguma vocação que seja legal e útil, quer seja para o trabalho manual, ou outro tipo de emprego, quer arando na fazenda, ou algum outro tipo de profissão que seja proveitosa para si mesmo e para o bem comum.”
Nesse contexto, deveríamos observar a importância da vida puritana-familiar com sua instrução acadêmica e espiritual aos filhos, o que trouxe muitos frutos em termos de diligência e atividade dos Estados Unidos.
Um livro fascinante foi escrito com o título “A Boston Puritana e a Filadélfia dos Quakers“. Nele, o autor compara o que aconteceu com a descendência dos Puritanos da cidade de Boston, e com a descendência dos Quakers na Filadélfia, e prova que os descendentes dos Puritanos exerceram uma influência muito maior até os dias de hoje. Conclusão: a influência intelectual, política e cultural na América tem vindo mais do lado Puritano do que do lado dos Quakers. Por falar nisso, alguém já fez um estudo que se tornou famoso sobre os descendentes do grande Puritano Jonathan Edwards. É impressionante observar a descendência de Jonathan Edwards em cada área da vida.
Em quinto lugar, este princípio regulador puritano influenciou grandemente na área da ciência, como é reconhecido pelos historiadores da ciência, como Butterfield e o professor Whitehead Huikos da Holanda. Falando deste último, referimo-nos ao seu livro “A religião e o surgimento da ciência moderna“. Neste livro ele diz algo que é reconhecido pelos demais historiadores da ciência, ou seja, que as raízes da ciência moderna estão no Movimento Puritano. Com isso não estamos querendo dizer que toda a ciência moderna no século XVII e XVIII é puritana, mas que uma porcentagem surpreendente do que foi feito em termos científicos está enraizada no movimento Puritano. Sabemos que a ciência, como era praticada no século XVII e XVIII, não se iniciou nas universidades de Cambridge e Oxford. Na realidade, os grandes avanços científicos se iniciaram em outra direção; eles surgiram da Sociedade Real de Londres, da qual, durante algum tempo, Isaque Newton foi membro. Além de seu trabalho científico, Newton escreveu vários livros sobre profecias e comentários de livros da Bíblia.
Vários desses membros da Sociedade Real de Londres tinham também sido membros da grande Assembléia de Westminster na década de 1640, e alguns dos professores de matemática e geometria, que estavam vivos naquela época, também tinham participado desta grande Assembléia. A doutrina da glória de Deus na criação, que eles sustentavam, foi o que tornou possível à ciência moderna avançar de forma tremenda.
Um outro aspecto do legado puritano que chega aos nossos dias foi a ascensão da classe pobre. O Prof. Jordan escreveu um livro importante: “Filantropia na Inglaterra – 1480/1660“. Neste livro, ele mostra que os Puritanos fizeram mais do que qualquer outro grupo para esvaziar as favelas, diminuir o crime e acabar com a pobreza. Eles literalmente reestruturaram a economia de tal forma que os pobres podiam participar. Eles não eram socialistas, pois criam no direito de liberdade privada (livre iniciativa), mas acreditavam que a misericórdia de Deus devia ser demonstrada a todas as pessoas de forma prática.
Certo teólogo anglicano, Lancelot Andrews, que na verdade não era um Puritano, observou em 1588 que as Igrejas Calvinistas de refugiados em Londres foram capazes de “fazer tanto bem, que nenhum de seus pobres é visto nas ruas a pedir”, os pedintes praticamente acabaram.
Outra coisa a ser mencionada foi a reconstrução do governo em termos da Palavra de Deus. Se tivéssemos tempo, falaríamos de John Knox, Samuel Rutheford e outros. Eles desenvolveram a idéia de que todas as pessoas são iguais diante da Palavra de Deus, e que qualquer que viola os seus direitos é um tirano, e o povo tem o direito de derrubá-lo do governo. É muito conhecido o fato de que, durante a revolução americana, aproximadamente dois terços da população na colônia era calvinista, incluindo presbiterianos, batistas e congregacionais. Foi o legado calvinista nas colônias americanas que os capacitou a tomar uma posição e ganhar a liberdade dos EUA.
Acreditamos que à medida que aprendermos e observarmos mais do legado Puritano em termos da nossa época e da nossa cultura, teremos também mais liberdade, mais bênção e menos pobreza no nosso país.